Governo Municipal envia a Câmara o Projeto de Lei nº 13/2021 que regulamenta o serviço de transporte particular gerenciado por aplicativos em Santos Dumont

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Santos Dumont, 26 de maio de 2021
Marcela Xavier

Proposto pelo Poder Executivo Municipal, o Projeto de Lei nº 13/2021, enviado à Câmara Municipal de Vereadores no dia 14 de maio, dispõe sobre o serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros, gerenciado por plataformas tecnológicas, no Município de Santos Dumont.

A propositura não foi submetida ao Conselho Municipal de Transportes, Trânsito e Mobilidade Urbana (COMTRAM), como relatou o Presidente do COMTRAM, Clésio Santos: “Recebi o projeto de lei via Whatsapp, quando já estava na Câmara e sendo intensamente comentado nas redes sociais. Não conheço sequer quem me enviou”.

A Lei Municipal nº 3.901, de 24 de abril de 2007 que criou o COMTRAM descreve o referido como órgão de controle social da gestão das políticas de trânsito, transporte e mobilidade urbana do Município, com caráter consultivo, fiscalizador e deliberativo, respeitando os aspectos legais de sua competência. “O COMTRAM gostaria de receber o PL nº 13/2021 para deliberar e propor emendas. É necessário discutir a situação com a Secretaria Municipal de Transportes e Trânsito de Santos Dumont, a fim de tomar decisões assertivas e justas relacionadas à regulamentação do serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros, gerenciado por plataformas tecnológicas”, asseverou Clésio.

Marcos Rocha, proprietário do aplicativo 510 Express, conta que soube que o PL nº 13/2021 estava sendo finalizado no departamento jurídico por meio das reuniões mensais do COMTRAM. Segundo ele, “a expectativa era que o projeto fosse avaliado pelo Conselho e divulgado para os responsáveis por aplicativos de transporte, antes de seguir para votação na Câmara de Vereadores. Porém, não foi o que aconteceu”.

Vereador Conrado Luciano Baptista em reunião na Câmara Municipal. Registro fotográfico realizado antes da pandemia.

Embora o vereador Conrado venha denunciando a situação em diversas ocasiões  e constantemente solicitando ao Governo Municipal que decisões referentes ao trânsito sejam submetidas ao COMTRAM, o atual Governo insiste em adotar uma postura de exclusão do órgão nas decisões municipais.

Na última segunda-feira (24), o vereador Conrado encaminhou indicação ao Presidente da Câmara Municipal de Santos Dumont, o vereador Luciano Gomes, solicitando o encaminhamento do PL nº 13/2021 para deliberação do COMTRAM, antes que ele seja colocado em pauta na Câmara Municipal. “Segundo a Lei Municipal nº 3.091, de 24 de abril de 2007, o COMTRAM deve discutir todo assunto relacionado ao trânsito e a mobilidade urbana da cidade. Caso venhamos a votar e discutir esse projeto sem parecer do COMTRAM, estaremos desrespeitando a Lei Municipal mencionada”, asseverou Conrado.

Ao ser questionado, o Diretor da Secretaria Municipal de Transportes e Trânsito, Paulo Barreto contou que não participou da elaboração do PL nº 13/2021 e que recebeu esta semana uma cópia do projeto. “Assumi a pasta há cerca de 2 meses. Esta demanda é mais antiga. Solicitei uma cópia do projeto de lei. Também solicitamos que a propositura seja retirada da pauta do legislativo para que eu e o COMTRAM possamos revisá-lo e fazer as alterações que julgarmos necessárias”, afirmou. Paulo reiterou que se reunirá com o COMTRAM para deliberar sobre e, caso seja possível, devolverá a pauta ao Poder Legislativo ainda esta semana. “Entendo que todas as decisões devem ser tomadas em conjunto com o COMTRAM”, asseverou.

Seguindo a atual redação, o PL nº 13/2021 exigirá cadastro e autorização anual concedida pela Secretaria Municipal de Transportes e Trânsito para motorista e veículo; recolhimento do Custo Gerencial Operacional (GCO) anual correspondente a aproximadamente R$ 117,20; tributação das plataformas tecnológicas; obrigatoriedade da apólice de seguros para usuários e condutores do serviço para Acidentes Pessoais de Passageiros (APP) e DPVAT (Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre), entre outras particularidades.

Só será permitida a utilização de veículos com, no mínimo, quatro portas, ar-condicionado e características originais de fábrica, respeitando exigências do Código de Trânsito Brasileiro. Segundo o art. 14 do PL nº 13/2021, “os veículos convencionais e adaptados deverão ser obrigatoriamente substituídos até o dia 31 (trinta e um) de dezembro do ano em que completarem 06 (seis) anos de fabricação”.

Conforme prevê a Lei Municipal nº 4.521, de 21 de fevereiro de 2020, que regulamenta o serviço de transporte individual de passageiros em veículo Táxi, a idade máxima permitida do veículo utilizado é de 6 (seis) anos, contados do ano de sua fabricação. Embora ambas as leis estejam em sintonia quanto a data de fabricação do veículo a ser utilizado, a Lei nº 4.521/2020 prevê no art. 11, parágrafo único, que quando o veículo táxi atingir 6 (seis) anos de fabricação, o autorizatário terá o prazo de 6 (seis) meses para substituí-lo. A Lei Federal nº 12.587/2012 prevê que o Município determine o ano de fabricação dos veículos utilizados para a prestação de serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros.

O Código de Trânsito Brasileiro, lei de 23 de setembro de 1997,  também prevê em seu art. 107, que os veículos de aluguel, destinados ao transporte individual ou coletivo de passageiros, deverão satisfazer, além das exigências previstas neste Código, às condições técnicas e aos requisitos de segurança, higiene e conforto estabelecidos pelo poder competente para autorizar, permitir ou conceder a exploração dessa atividade. Em concordância com ela, a Lei Federal nº 12.587/2012 também prevê em seu art. 12 que os serviços de utilidade pública de transporte individual de passageiros deverão ser organizados, disciplinados e fiscalizados pelo poder público municipal, com base nos requisitos mínimos de segurança, de conforto, de higiene, de qualidade dos serviços e de fixação prévia dos valores máximos das tarifas a serem cobradas.

Após ouvir motoristas de vários aplicativos que prestam serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros, Conrado pontuou: “É imprescindível regulamentá-lo por força da Lei Federal nº 12.587/2012, para que o Município fiscalize o transporte, evitando acidentes e estabelecendo regras. Porém, se a regulamentação for demasiado rigorosa, pode impossibilitar o funcionamento deste serviço em Santos Dumont”.

O PL nº 13/2021 precisa seguir as diretrizes da Lei Federal nº 12.587, de 3 de janeiro de 2012, que instituiu as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana. A Lei Federal nº 13.640, de 26 de março de 2018, também conhecida como “Lei do Uber”, alterou a Lei Federal nº 12.587/2012, regulamentando o transporte remunerado privado individual de passageiros. Estas leis obrigam o Município há regulamentar este serviço.

Os requisitos previstos na Lei nº 13.640/2018 para trabalhar com o serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros é: possuir Carteira Nacional de Habilitação na categoria B ou superior que contenha a informação de que exerce atividade remunerada; conduzir veículo que atenda aos requisitos de idade máxima e às características exigidas pela autoridade de trânsito e pelo poder público municipal e do Distrito Federal; emitir e manter o Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo (CRLV) e apresentar certidão negativa de antecedentes criminais.

Representante dos aplicativos 14 Bis Drive, 510 Express, 95 Drive, Cabangu Mobi, Social Mobi e Toda Hora Drive, o advogado Renato Rodrigues Neto redigiu uma nota intitulada “Fim do ‘Uber’ em Santos Dumont”, publicada no último dia 20, onde critica o PL nº 13/2021, afirmando que “o Projeto de Lei proposto é extremamente prejudicial aos aplicativos e também aos passageiros, uma vez que ilegalmente visa burocratizar o exercício do serviço, dificultando sobremaneira os aplicativos e assim beneficiando outras categorias que atuam no setor de transporte de passageiros”.

Em entrevista exclusiva realizada para a divulgação desta matéria, o advogado apontou itens em discordância no Projeto de Lei nº 13/2021 em relação às Leis Federais nº 12.587/2012 e nº 13.640/2018, como a definição de “autorizações, proibições, vistorias e previsão de penalidades”. Renato afirma que o projeto “busca redefinir o conceito de transporte remunerado privado individual de passageiros, tornando-o mais restritivo. Cerca de 80% dos artigos extrapolam o que prevê a legislação federal, punindo, dificultando o registro e criando barreiras em todos os teores. Isto não é permitido, pois, segundo o Supremo Tribunal Federal (STF), os Municípios que optarem pela regulamentação, não podem contrariar ou estabelecer requisitos adicionais aos que já estão estabelecidos pelas Leis Federais nº 12.587/2012 e nº 13.640/2018”.

Para o motorista do aplicativo Cabangu Mobi, Clesson Alvim, a proibição do uso de carros com mais de seis anos de fabricação é o ponto mais problemático do PL nº 13/2021.  “Vivemos um momento complicado no país. Como alguém que tem família e contas para pagar vai entrar em um financiamento agora? Um carro nas condições determinadas pelo PL nº 13/2021, com menos de 6 anos, não custa menos que R$ 40.000,00. Não é justo exigir carros com até 6 anos de fabricação. Taxistas têm isenção em várias situações, como isenção de IPVA. Além disso, também conseguem comprar carros com desconto”, apontou.

Clesson passou a trabalhar como motorista de aplicativo após perder o emprego. “Hoje, é minha renda principal”, relatou. Frente à crise econômica vivida em todo o país, vários profissionais precisaram encontrar novas formas de trabalho para garantir seu sustento. De acordo com o IBGE, em fevereiro deste ano havia aproximadamente 14,4 milhões de brasileiros desempregados. O número é 2,9% maior em relação ao trimestre anterior (setembro, outubro e novembro de 2020), indicando que cerca de 400 mil pessoas perderam seus postos de trabalho neste período. Em comparação ao trimestre citado, o número de trabalhadores autônomos cresceu 3,1%, indicando que 716 mil pessoas passaram a trabalhar por conta própria.

Um taxista que não quis se identificar afirmou que diversos motoristas de aplicativos locais aceitam corridas fora do aplicativo, por contatos feitos através do telefone/WhatsApp pessoal, atuando como taxistas e não como motoristas de aplicativo. “Deixam um cartão com contatos pessoais em cada viagem. Desta forma, quando são chamados, não pagam a comissão ao proprietário do App. Também há aqueles que ficam parados em pontos estratégicos da cidade, aceitando corridas de quem se aproximar. Além disso, há motoristas em portas de supermercados, abordando clientes e oferecendo seus serviços. O direito a estas corridas é dos taxistas, que são cadastrados na Prefeitura e cumprem todas as exigências.”, relatou.

Questionado quanto às afirmações do taxista que preferiu não se identificar, o advogado representante dos aplicativos de transporte remunerado privado individual de passageiros em Santos Dumont, respondeu que “a legislação federal define claramente que as corridas devem ser solicitadas por usuários cadastrados nos aplicativos ou em outras plataformas de comunicação em rede, como o Whatsapp. Quanto ao cartão com telefone pessoal, é uma prática legalizada utilizada por taxistas e motoristas de aplicativo, desde que registrem a corrida no aplicativo”.

Considerando que o transporte por aplicativos é legalizado, há segurança para os clientes. “No aplicativo há registro das corridas e passageiros. O aplicativo tem motoristas cadastrados, com dados atualizados. As corridas são acompanhadas e podem ser verificadas depois, porque ficam registradas na central, tornando o transporte por aplicativo seguro. Também é possível avaliar o serviço na plataforma, assim como fazer denúncias”, pontuou o advogado.

Quanto ao transporte clandestino citado pelo taxista, Renato ratificou que “há pessoas que estão nas portas dos supermercados abordando clientes. São motoristas clandestinos, que não trabalham em nenhum aplicativo e utilizam a designação de UBER para fazer o transporte de passageiros. Estes motoristas trabalham na ilegalidade e podem sofrer as sanções previstas em lei”.

Quanto a abordagem de clientes, Renato declarou: “Não recomendamos nem apoiamos a abordagem dos clientes, até porque, nossos motoristas trabalham identificados e seus respectivos veículos possuem adesivo do aplicativo. Caso seja necessário, o próprio cliente fará a abordagem. Quando um motorista é procurado, ele registra a corrida no aplicativo manualmente. A central do aplicativo receberá a corrida e irá acompanhá-la. A regra geral em todos os aplicativos para motoristas que não registram a corrida, é a exclusão do aplicativo. Outro comportamento sujeito à exclusão é oferecer os serviços de transporte por aplicativo em pontos de ônibus ou táxi”.

Por força de lei federal, Conrado defende a regulamentação do serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros para que não seja criada uma concorrência desleal entre outros serviços oferecidos, que já são regulamentados. “Se não for regulamentado o serviço de transporte administrado por aplicativo, o município pode ser responsável e até mesmo responder em caso de acidente. Portanto, é necessário defender a regulamentação com justiça e razoabilidade”, concluiu.