Câmara derruba veto do Governo Municipal a respeito da Municipalização
Santos Dumont, 14 de outubro de 2021
Marcela Xavier
No último dia 04, a Câmara de Vereadores derrubou o veto do Poder Executivo ao Projeto de Lei nº 14/2021, de autoria do Vereador Conrado (PT), que “Dispõe sobre a obrigatoriedade de realização de consulta pública prévia junto à comunidade escolar e ao Poder Legislativo Municipal, além da realização de audiência pública para fins da municipalização da gestão dos anos iniciais do ensino fundamental das Escolas Estaduais de Santos Dumont, e dá outras providências.” A nova Lei Municipal será sancionada neste mês de Outubro.
A propositura visa dificultar a Municipalização na cidade. Para o Vereador Conrado, “o projeto é estratégico, pois obriga que seja realizado um rigoroso procedimento em caso de Municipalização”.
Caso haja interesse em municipalizar, o Governo Municipal não deve só concordar com o Governo do Estado. Veja, em resumo, as regras que precisam ser respeitadas estabelecidas na lei aprovada:
- A Prefeitura deve realizar um colegiado escolar em cada escola envolvida na municipalização para que os educadores sejam consultados sobre a medida;
- Deve ser realizada uma audiência pública na Câmara Municipal;
- Após os dois procedimentos, o Governo Municipal deve apresentar na Câmara Municipal um projeto de lei contendo a capacidade orçamentária de aceitar as turmas a serem municipalizadas e a garantia da mesma qualidade da educação infantil, além de comprovar recursos de infraestrutura e de pessoal da educação infantil e dos anos iniciais.
- Tal projeto de lei precisará ser aprovado na Câmara Municipal e sancionado.
Observe que se a medida da municipalização não for adequada, os educadores terão a legitimidade de se manifestar e os vereadores também. Esta lei protege a educação de eventuais retrocessos. “A ideia da lei é dificultar ao máximo a municipalização, e permitir que tal procedimento seja feito somente se for para melhorar a educação na cidade de Santos Dumont” enfatizou Conrado.
O Vereador Conrado pede que todas as Câmaras Municipais aprovem projetos como esse. “Peço aos vereadores de Minas Gerais que aprovem este projeto, estou à disposição para ajudar os vereadores e vereadoras na apresentação desses projetos. Precisamos proteger nossas escolas e a educação pública”.
Projeto Mãos Dadas do Governo do Estado
O Projeto de Lei nº 2657/2021, também conhecido como Projeto Mãos Dadas, entrou em tramitação na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) no dia 28 de abril deste ano, mas foi divulgado previamente pelo Governo do Estado e pela Secretaria de Estado de Educação no dia 3 de março.
A propositura do Governo Estadual visa transferir a responsabilidade de arcar com a educação dos anos iniciais do Ensino Fundamental para os Municípios, sob a alegação de que esta será uma parceria para distribuição de recursos estaduais e revitalização das escolas. A justificativa apresentada é que o recurso economizado pela Municipalização será investido no Ensino Médio. “Embora o artigo 211, §3º, da Constituição e o artigo 10, inciso VI, da Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, estabeleça que a prioridade dos Estados é a educação do Ensino Médio, estes fundamentos determinam que o Estado assegure o Ensino Fundamental. Assegurar não é sinônimo de entregar. Nesse sentido, a municipalização de acordo com a proposta do Governo de Minas em nosso Estado é até inconstitucional”, afirmou o Vereador Conrado.
Veto do Poder Executivo Municipal
Em reunião ordinária da Câmara Municipal, realizada no dia 09 de agosto deste ano, foi aprovado por unanimidade o PL nº 14/2021. Porém, no dia 08 de setembro, o Poder Executivo Municipal apresentou veto integral à propositura, alegando que a decisão sobre o Município aceitar ou não a Municipalização deve ser tomada pelo Estado e pelo Governo Municipal, a partir de estudos técnico-científicos, e não por meio de consultas públicas aos profissionais de educação e de toda a comunidade escolar, posto que se ocorrer consultas públicas aos profissionais da educação, a técnica e a ciência poderiam ser comprometidas, já que estas pessoas votariam por emoção.
Além disso, o Executivo Municipal afirmou não desejar uma politização da Municipalização. Disse que o projeto é ilegal, e fere a Lei Orgânica ao gerar aumento de despesa. “Todavia, permitir a municipalização sem que haja consulta popular e dos educadores, é uma medida equivocada”, segundo o vereador Conrado. Para ele, ao vetar o projeto de sua autoria, “o Executivo, se apresentou favorável a municipalização, e a justificava apresentada é ainda mais grave, pois o Executivo se mostrou desconfortável na exigência de que a municipalização para acontecer na cidade tenha participação popular e oitiva dos profissionais envolvidos. Os educadores dedicam suas vidas a educação, ouvi-los é uma forma de respeitar sim a ciência e a técnica, além de respeitar o princípio da gestão democrática do ensino público previsto no artigo 206, inciso IV, da Constituição”.
Qual o tamanho da Rede Estadual de Ensino em Santos Dumont?
Alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental matriculados na rede estadual de ensino de Santos Dumont/MG:
Escolas Estaduais | Bairro | Nº de matriculados | Nº de turmas |
E. E. Cornélia Ferreira Ladeira | Glória | 220 | 5 |
E. E. Doutor Vieira Braga | São Sebastião | 295 | 15
(2 turmas em tempo integral) |
E. E. João Gomes Velho | Santo Antônio | 125 | 6
(1 turma em tempo integral) |
E. E. Professora Joana Cunha | Vila Esperança | 117 | 5 |
E. E. Vieira Marques | Centro | 744 | 28
(1 sala de recursos) |
Fonte: Levantamento realizado pelo Vereador Conrado junto a diretores (as) das escolas estaduais em setembro de 2021.
Ao todo, o Estado possui 59 turmas dos anos iniciais do Ensino Fundamental em Santos Dumont, totalizando 1.501 alunos. As escolas municipais possuem, aproximadamente, 830 alunos dos anos iniciais do ensino fundamental. “Caso venha a ocorrer a Municipalização, o Município terá que arcar com todas as despesas de, aproximadamente, 2.331 alunos e 60 professores (as). Isso representa um aumento de 180,8% no número de estudantes”, ressaltou o vereador.
Por que não municipalizar?
O Governo do Estado oferece um investimento de R$ 500 milhões para os Municípios que aderirem à Municipalização dos anos iniciais do Ensino Fundamental. A verba poderá ser utilizada para a construção de escolas, aquisição de mobiliários, obras e reformas.
Minas Gerais possui 853 Municípios. Se todas as Prefeituras aderirem à Municipalização, cada município receberá um valor muito pequeno para administrar os anos iniciais. Além disso, como já dito, a municipalização proposta desta maneira desrespeita a Constituição e a LDB, já que o Estado passará a não assegurar o ensino fundamental. “O Projeto Mãos Dadas é, na verdade, uma entrega da educação dos anos iniciais do Ensino Fundamental para os Municípios. Não é uma parceria ou investimento em Educação”, afirmou Conrado.
O próprio recurso de 500 milhões divulgado pelo Estado a ser investido uma única vez nos municípios que desejarem a municipalização não é garantido, pois, segundo o artigo 5º, § 1º, do Projeto Mãos Dadas, este recurso só será encaminhado se o Estado tiver condições orçamentárias. “Em outras palavras, oficialmente, este possível investimento em municípios que aceitarem a municipalização não é certo”, esclareceu Conrado.
De acordo com documento emitido pela Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais, o Estado investe aproximadamente 6 milhões por ano em Santos Dumont, considerando despesas com pessoal, despesas de alimentação, manutenção e serviços básicos como água, energia elétrica e telefonia.
O Estado aposta que, com o aumento das matrículas dos anos iniciais do Ensino Fundamental na rede municipal de educação pública, ocorrerá aumento significativo no total enviado pelo Governo Federal por meio da implementação do Novo Fundeb.
No entanto, o que vemos é o oposto do que é alardeado por Zema (Partido Novo): apenas este ano, o Presidente Bolsonaro (sem partido) já cortou do orçamento da Educação R$ 2,7 bilhões. No último dia 16, Bolsonaro afirmou que “[…] o estado foi muito inchado. Não estou dizendo que não precisa de professor, mas o excesso atrapalha”, afirmou em conversa com seus apoiadores, no Palácio da Alvorada. Além disso, o país ainda sofre com os efeitos da PEC 55/2016, que congelou os gastos públicos por 20 anos, incluindo gastos em educação.
É importante lembrar que o Governador Zema não gastou 25% do que foi arrecadado em 2019 com a educação, percentual obrigatório previsto na Constituição, violando a lei. Ocorreu um déficit de 2,7 bilhões na educação em 2019, reconhecido pelo Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais.
O Estado possui mais recursos econômicos para investir na Educação dos anos iniciais do Ensino Fundamental do que os Municípios. “Os salários dos profissionais de educação estaduais são maiores do que os salários dos profissionais da rede municipal de ensino. O Estado oferece plano de saúde para seus servidores, mas as Prefeituras não. Além disso, o Estado tem condições de investir mais nas escolas do que os Municípios”, reiterou Conrado.
Segundo o Vereador Conrado, o Município de Santos Dumont já aderiu à Municipalização dos anos iniciais do Ensino Fundamental na década de 90. “A experiência de Municipalização em Santos Dumont não deu certo da primeira vez. Precisamos levar em consideração que estamos vivendo uma pandemia e que os Municípios estão sofrendo muito com a crise econômica agravada pelo Covid-19”, ressaltou.
Municipalização como ferramenta para criação do Estado Mínimo
Segundo o Vereador Conrado, assim como o Presidente Bolsonaro, o Governador Zema é um defensor do Estado Mínimo. “Acreditam que diminuir o Estado é uma vantagem, ainda que essa medida importe em empobrecer a população. Porém, os serviços públicos custeados pelo Estado a partir da arrecadação de impostos são de suma importância para atender às necessidades básicas da população, posto que vivemos em um país muito desigual. O serviço público precisa ser forte para garantir educação, saúde e assistência ao povo”, asseverou.
Zema deseja realizar a Municipalização em um acordo direto entre o Governo do Estado e as Prefeituras, sem que haja envolvimento das Câmaras Municipais e discussão com educadores e a sociedade civil. “As discussões sobre a Municipalização por parte do Estado começaram em março deste ano, no auge da pandemia. Foi um momento delicado, onde educadores e representantes da sociedade civil enfrentaram dificuldades até mesmo para se reunir remotamente. Percebendo que o Projeto Mãos Dadas não seria facilmente aprovado na ALMG, Zema decidiu negociar a Municipalização diretamente com as Prefeituras”, afirmou Conrado.
Existe um movimento no Brasil de fortalecimento do Estado Mínimo, com consequente redução no fornecimento de serviços públicos e direitos sociais, tais como educação e saúde, que tem sido defendido por parlamentares e apoiadores. “O Projeto Mãos Dadas é consequência da visão política do Estado Mínimo. Recentemente passamos pela Reforma da Previdência, Reforma Trabalhista e Terceirização. Tal mudança no pensamento político tem empobrecido a população. O Brasil é o país que mais concentra renda no mundo, a diminuição do Estado e dos serviços públicos só aumenta a desigualdade social, já que os mais pobres não têm como melhorar sua qualidade de vida sem a pontual oferta destes serviços”, esclareceu o Vereador.
Para Alessandro Furtado, membro da Direção do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE) – Subsede Juiz de Fora, o Governo Zema é ultra neoliberal e não tem compromisso com o povo, mas apenas com as finanças do Estado. Para ele, é preciso que a população tenha ciência do que está por trás da Municipalização. Com a Municipalização das escolas estaduais responsáveis pelos anos iniciais do Ensino Fundamental, Zema se desresponsabiliza de gerir essas unidades de ensino. “Precisamos denunciar, pois o Projeto Mãos Dadas está alinhado com várias iniciativas do Governo Zema, que buscam diminuir as receitas estaduais, levando à extinção de determinados cargos dentro das escolas, trazendo prejuízo a milhares de educadores estaduais, levando água abaixo os sonhos destes profissionais que dedicaram suas vidas e formação à construção de um projeto de vida pautado em educar, alfabetizar”, afirmou.